Publicada na última quinta-feira (09), pela revista Zootaxa – disponível aqui –, a descoberta foi realizada pelo Prof. Thiago G. Kloss, da UEMG Unidade Ubá, em parceria com o Dr. Diego G. Pádua, do Programa de Pós-Graduação em Entomologia do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). A nova espécie de vespa parasitoide (Acrotaphus wagnerianae) ocorre no estado do Amazonas e foi coletada na Reserva Florestal Adolpho Ducke e no município de Coari.
Os autores observaram que essa nova espécie de vespa parasita aranhas do gênero Wagneriana (Araneidae) e possui a capacidade de transformá-las em zumbis. A vespa deposita um ovo no abdômen da aranha, dando origem a uma larva que se alimenta sugando a hemolinfa dos aracnídeos. Quando a larva da vespa está pronta para construir seu casulo (semelhante ao das borboletas), ela induz a aranha a construir uma teia mais resistente. Feito isto, a larva mata a aranha e constrói um casulo no centro da teia modificada, que é mais resistente, sendo essencial para que a vespa sobreviva até o momento de eclodir como um novo inseto adulto.
Em detalhe, na imagem, um exemplar macho da espécie descoberta
Professor efetivo da UEMG, desde 2017, lecionando disciplinas no curso de Ciências Biológicas da Unidade Ubá e, também, no curso de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Unidade Frutal, o Prof. Thiago Kloss, que é um dos autores da descrição da nova espécie, concedeu-nos uma breve entrevista sobre o feito:
. Conte-nos um pouco mais sobre o projeto de pesquisa em que se deu a descrição da nova espécie.
A publicação é vinculada ao meu projeto “Parasitismo em aranhas: biologia, ecologia e estudo dos mecanismos de manipulação comportamental”, que vem sendo desenvolvido desde a minha chegada na UEMG. Seus objetivos centrais estão relacionados: à busca de novas espécies de vespas que possuem a capacidade de manipular o comportamento de aranhas hospedeiras (grupo de vespas Polysphincta); com a investigação sobre a história natural das espécies envolvidas nessas interações de manipulação comportamental e com a investigação do mecanismo que as vespas utilizam para conseguir alterar o comportamento das aranhas hospedeiras.
O projeto já realizou diversas coletadas na Mata Atlântica de Minas Gerais e do Espírito Santo, além da Amazônia. O projeto possui parceira com diversos pesquisadores de outras instituições, como o coautor do artigo publicado. Outras interações já foram descritas (a exemplo deste vídeo da Fapesp, indicado pelo Prof. Thiago) e os detalhes sobre como os parasitoides conseguem alterar o comportamento das vespas já foram obtidos. As publicações sobre esses resultados estão em fase de elaboração.
. Quando exatamente aconteceu a descoberta e, resumidamente, como foi possível determiná-la?
A descoberta aconteceu em uma expedição de coleta realizada na Reserva Florestal Adolpho Ducke (Manaus), em outubro de 2018, em parceria com o Dr. Diego G. Pádua, do INPA, que é especialista desse grupo de parasitoides. Em campo nós detectamos uma aranha parasitada, que estava no centro da sua teia com uma larva aderida ao seu abdômen. Essa larva já estava no estágio final de desenvolvimento, momento no qual o comportamento da aranha é modificado e a larva mata a aranha, iniciando o processo de construção do seu casulo (que fica suspenso no centro da teia modificada).
Nós identificamos o local da teia e aguardamos a morte da aranha. Retornamos no dia seguinte e constatamos que a aranha já estava morta e que o casulo da vespa estava em construção. Em seguida, descrevemos e fotografamos a estrutura da teia modificada e coletamos o casulo, que foi conduzido a um laboratório de Entomologia do INPA, onde aguardamos a eclosão do parasitoide adulto, o que ocorreu após alguns dias. Após a eclosão, o inseto foi montado e comparado com outros indivíduos depositados na coleção do INPA.
O Dr. Diego Pádua observou que o indivíduo era semelhante a outros dois: um coletado na mesma reserva, em 1995, e outro coletado em 1992, no município de Coari-AM. Analisando esses 3 indivíduos foi possível determinar que eles possuíam características morfológicas distintas das espécies conhecidas do gênero Acrotaphus, o que suportou a classificação desses indivíduos como pertencentes a uma nova espécie.
Na imagem, a teia modificada (A), a aranha morta no centro da "nova" teia (B) e o casulo construído pela larva no centro da nova teia alterada (C)
. O que esse acontecimento representa para a sua atuação profissional?
Trabalhar com investigações sobre a história natural das espécies é sempre algo gratificante, especialmente na região tropical onde a diversidade é muito grande. Entretanto, descobrir uma nova espécie de inseto não é algo raro. Diversas espécies são descritas constantemente. O Brasil apresenta uma biodiversidade enorme e ainda existem diversas espécies a serem descobertas, o que reforça a necessidade de investimento em pesquisa básica no país.
Esse trabalho representa a adição de mais um “tijolo” na construção do conhecimento sobre a biodiversidade do Brasil. Além disso, estudos desse tipo são essenciais para a compreensão da evolução de determinadas características desse grupo de insetos, como a capacidade que essas vespas desenvolveram em manipular o comportamento dos hospedeiros e obter benefício próprio com isso.